Luiz Gustavo Guimarães Sacramento
Paralisia obstétrica (PO) é a lesão do plexo braquial ao nascimento, sendo considerada, então, um tocotraumatismo. A flexão do pescoço com o ombro fixado ou estiramento do braço em abdução resultam em estiramento ou em avulsão das raízes medulares, que se manifestam como alteração ipsilateral sensitiva e motora no membro superior do recém-nascido [1], com sinais e sintomas distintos dependentes de qual parte do plexo braquial foi lesada.
Anatomia
O plexo braquial é a denominação dada à união dos ramos ventrais dos quatro últimos nervos cervicais (C5-C8) e o primeiro nervo torácico (T1) – raízes do plexo braquial -, sendo esse plexo responsável pela maior parte da inervação dos membros superiores [2]. É relatada, também, a participação dos ramos de C4 ou ainda de T2 na formação do plexo, em 22% e 1% da população, respectivamente [3].
Três troncos são formados na parte inferior do pescoço: tronco superior, da união das raízes de C5 e C6, tronco médio, continuação da raiz de C7, e tronco inferior, da união das raízes de C8 e T1. Cada tronco apresenta ramificações anteriores e posteriores, de modo que as divisões ventrais destinam-se aos músculos anteriores – flexores – e as divisões dorsais aos músculos posteriores – extensores. As divisões anteriores dos troncos superior e médio formam o fascículo lateral; as divisões posteriores dos troncos superior, médio e inferior formam o fascículo posterior, enquanto a divisão anterior do tronco médio continua como fascículo medial. Desse modo, percebe-se que o fascículo lateral é composto por fibras de C5, C6 e C7; o fascículo medial, fibras de C8 e T1, e o fascículo posterior, C5, C6, C7, C8 e T1 [4].
Tem-se, então, que o plexo braquial resulta em nervos periféricos multissegmentares, que são descritos de acordo com a divisão do plexo em partes supraclavicular e infraclavicular em decorrência da posição anatômica da clavícula. No que se refere aos ramos da parte supraclavicular, há quatro ramos que são originados das raízes (ramos anteriores) e dos troncos do plexo braquial, sendo eles: nervo supraescapular, nervo torácico longo, nervo dorsal da escápula e nervo para o músculo subclávio. Há também, ramos musculares, sem nome oficial, que suprem o músculo escaleno e músculo longo do pescoço, e que se originam das cinco raízes do plexo (C5-T1). Já a raiz C5 do nervo frênico (ramo do plexo cervical) origina-se da raiz C5 e se une a C3-C4 do nervo na face anterior do músculo escaleno anterior. Por sua vez, os ramos da parte infraclavicular são originados dos fascículos do plexo braquial. Desse modo, os fascículos medial e posterior são responsáveis por originarem cinco ramos cada, enquanto que, levando em consideração os ramos colaterais e terminais, o fascículo lateral origina três ramos [2].
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Epidemiologia
Na literatura, há discordâncias a respeito da incidência da paralisia obstétrica, de tal forma que essa varia de 1 a 2 por 1000 nascidos vivos, sendo considerada uma ocorrência frequente [5,6]. Os fatores de risco descritos incluem: distocia de ombro, macrossomia fetal, parto com fórceps ou sob instrumentação, trabalho de parto prolongado, multiparidade e diabetes gestacional. Por outro lado, apesar de não o eliminar, a cesárea reduz o risco de paralisia do plexo [7]. A maioria dos casos tem recuperação espontânea nos primeiros 2 meses de idade, chegando a quase recuperação total da movimentação e da força. Contudo, os lactentes que não apresentam recuperação relevante até os 3 meses de idade tem permanentes redução da amplitude de movimento, da força e do tamanho do membro acometido [8].
Diagnóstico e classificação
O diagnóstico, geralmente, pode ser realizado pouco tempo após o nascimento por meio da constatação da ausência de movimentação do ombro, cotovelo, antebraço, punho e/ou dedos, mas é recomendado que se espere duas semanas para a definição do quadro clínico de PO. Como os recém-nascidos apresentam função motora coordenada principalmente por reflexos primitivos, o diagnóstico é apoiado na ausência ou na assimetria de reflexos que induzem flexão do cotovelo e a extensão do punho e dos dedos. Dessa forma, são analisados o reflexo de Moro e o reflexo tônico cervical assimétrico. Em alguns casos, exames de imagem apresentam grande valia diagnóstica. Além disso, o diagnóstico de paralisia obstétrica também requer a avaliação da articulação gleno-umeral na busca por displasia, subluxação ou luxação [8].
Após o diagnóstico ser realizado, é imprescindível detectar o nível da lesão e a gravidade de sua repercussão, visto que são fatores determinantes para a possível recuperação espontânea. Assim, a localização anatômica da lesão é determinada pela ausência de movimentos básicos [1]:
C5
Abdução e extensão do ombro
C6
Flexão do cotovelo
C7
Extensão do cotovelo
C8
Extensão do punho e dos dedos
T1
Musculatura intrínseca dos dedos
Após a análise dos movimentos básicos, as lesões são classificadas entre [8]:
Paralisia alta ou de Erb - lesão em raízes C5 e C6. Comprometimento de abdução do ombro, rotação externa do ombro e flexão do cotovelo. Corresponde a aproximadamente 60% das lesões.
Paralisia de Erb estendida - lesão em raízes C5, C6 e C7. Aproximadamente de 20% a 30% das lesões.
Paralisia total do membro superior – lesão em raízes C5, C6, C7, C8 e T1. Cerca de 15% a 20% das lesões.
Paralisia de Klumpke – lesão em raízes C8 e T1. Lesão extremamente rara. Em alguns casos, associa-se à síndrome de Horner, apresentando pior diagnóstico.
Tratamento
O primeiro tratamento após diagnóstico de PO sem fratura é o fisioterapêutico, por meio de exercícios diários de mobilização passiva da extremidade envolvida, com assistência de profissional da área e dos pais. Contudo, quando as lesões são mais complexas, o tratamento fisioterapêutico é menos favorável, de modo a ser recomendado o procedimento cirúrgico, sendo o enxerto de nervo sural considerado atualmente o padrão-ouro [8].
Conclusão
Percebe-se, desse modo, a importância e a relevância de se ter pleno domínio do conhecimento anatômico do plexo braquial para conseguir realizar o diagnóstico de Paralisia Obstétrica o mais precocemente possível, visto que este é basicamente clínico-neurológico. Com um diagnóstico precoce, cerca de duas semanas após o parto, é possível iniciar o tratamento e, então, resultar em melhor prognóstico ao paciente, objetivo final de toda a medicina.
Referências
RIBEIRO, PAULO RONALDO JUBE; SPARAPANI, FABIO VEIGA DE CASTRO. Paralisia obstétrica do plexo braquial. Revista Brasileira de Neurologia e Psiquiatria. 2014 Maio/Ago;18(2):148-15
MOORE, Keith L. Anatomia orientada para a clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014
Lee HY, Chung IH, Sir WS, et al. Variations of the ventral rami of the brachial plexus. J Korean Med Sci. 1992; 7(1):19-24
Petroianu A. Anatomia cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999.
Gilbert WM, Nebitt TS, Danielsen B. Associated factors in 1611 cases of brachial plexus injury. Obstet Gynecol. 199; 93(4):536-540
Bager B. Perinatally acquired brachial plexus palsy—a persisting challenge. Acta Paediat. 1997; 86(11):1214-1219
Sibinski M, Synder M. Obstetric brachial plexus palsy- risk factors and predictors [in Polish]. Ortop Traumatol Rehabil. 2007;9(6):569-576.
Abzug, J. M., & Kozin, S. H. (2010). Current Concepts: Neonatal Brachial Plexus Palsy. Orthopedics, 33(6), 430–435. doi:10.3928/01477447-20100429-25
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