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Tetralogia de Fallot

Larissa Murici Sousa, acadêmica do curso de medicina da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais


Introdução

As anomalias congênitas são distúrbios estruturais e/ou funcionais de células, órgãos ou sistemas, presentes no nascimento. Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), os defeitos congênitos são responsáveis por até 21% das mortes de crianças menores de cinco anos na América Latina. Essas anormalidades podem ser causadas por fatores genéticos, ambientais ou por uma interação do ambiente com a susceptibilidade genética do indivíduo. As malformações cardíacas e vasculares constituem a maior categoria de defeitos congênitos humanos e são a principal causa de morte na primeira infância em países desenvolvidos. Nesse ínterim, a Tetralogia de Fallot é a cardiopatia congênita cianótica mais frequente, correspondendo a cerca de 10% dos defeitos congênitos do coração.


Etiologia

A origem da Tetralogia de Fallot, bem como a de outras malformações cardíacas, não é bem determinada. Contudo, as anormalidades cromossômicas são mais frequentes em pacientes com malformações cardíacas congênitas do que na população em geral. Dessa forma, há uma associação dessa anomalia com a Síndrome de Down e com deleções no cromossomo 22.


Anatomia

Durante o desenvolvimento embrionário, o coração passa por uma série de transformações, passando do formato tubular para a conformação convencional com quatro câmaras. A septação do tronco arterial ocorre durante a quinta semana embrionária, com a formação de pares de coxins opostos, que crescem em direção ao saco aórtico de forma espiral, originando o septo aorticopulmonar, que separa os canais aórtico e pulmonar. A Tetralogia de Fallot é decorrente de uma divisão desigual do tronco arterial, resultante do deslocamento anterior do septo aorticopulmonar ou infundibular. Esse deslocamento produz quatro alterações: 1) estenose pulmonar (obstrução do fluxo de saída ventricular direito); 2) defeito do septo interventricular; 3) dextraposição da aorta; 4) hipertrofia ventricular direita.



Figura 1 - Alterações cardíacas na Tetralogia de Fallot, disponível em: https://www.heart.org/en/health-topics/congenital-heart-defects/about-congenital-heart-defects/tetralogy-of-fallot









Fisiopatologia

O deslocamento do septo infundibular ântero-superiormente é responsável pelo defeito do septo interventricular e pela dextroposição da aorta, que é chamada de aorta cavalgada. A estenose pulmonar ocorre por vários mecanismos. O deslocamento do septo, juntamente com o espessamento muscular abaixo da valva pulmonar, é responsável por uma obstrução subpulmonar. Além disso, a valva pulmonar pode ser estenótica e as artérias pulmonares, hipoplásicas, intensificando a obstrução. A hipertrofia do ventrículo direito é decorrente da estenose pulmonar, uma vez que há uma sobrecarga por pressão.

A apresentação clínica da Tetralogia de Fallot depende do grau de obstrução do fluxo de saída ventricular direito. Nas crianças com uma obstrução leve, a tendência é que haja um shunt do ventrículo esquerdo para o ventrículo direito. Nesse caso, o sangue direcionado à aorta e que chega na circulação sistêmica é oxigenado, não ocorrendo cianose. Todavia, o intenso fluxo sanguíneo para os pulmões pode gerar sintomas, como taquipneia, hiporexia e redução do ganho de peso. Com o tempo, podem ocorrer sintomas de insuficiência cardíaca congestiva.

Quando a obstrução do fluxo de saída ventricular direito é intensa, a pressão do ventrículo direito supera a do ventrículo esquerdo. Ocorre, assim, um shunt do ventrículo direito para o esquerdo, fazendo com que o sangue desoxigenado flua pela aorta e alcance a circulação sistêmica. As crianças com esse quadro costumam ter a saturação de oxigênio menor do que 70% e apresentam cianose.


Crises hipercianóticas

Crianças com Tetralogia de Fallot podem sofrer crises hipercianóticas, que ocorrem quando há uma mudança abrupta no fluxo sanguíneo. Nesses episódios, há aumento da resistência vascular pulmonar e redução da resistência vascular periférica, o que faz com que o sangue desoxigenado passe do ventrículo direito para o esquerdo, diminuindo a saturação de oxigênio. Essas crises podem ser precedidas por atividades físicas, pois a demanda metabólica aumenta, o que leva ao aumento da frequência cardíaca, intensificando esse shunt. É comum acontecerem pela manhã, quando o bebê está chorando ou se alimentando, ou quando está sob situações de estresse, sendo mais frequente nos lactentes de 2 a 4 meses de idade.

Os episódios de hipercianose são caracterizados por extrema irritabilidade, choro, taquipneia, cianose intensa, palidez, letargia e perda de consciência. Pode ocorrer acidose metabólica, agravando o quadro. O tratamento inclui acalmar o bebê e colocá-lo numa posição em que os joelhos fiquem contra o tórax. Nessa posição agachada, ocorre compressão da artéria femoral, aumentando a resistência vascular periférica e aliviando a crise. Em ambiente hospitalar, medicamentos são administrados. Quando uma crise hipercianótica ocorre, é indicado o tratamento cirúrgico, a fim de evitar novas crises.



Figura 2 - Representação de criança em crise hipercianótica, disponível em: http://eclinicalworks.adam.com/content.aspx?productId=39&pid=1&gid=001567&print=1









Tratamento cirúrgico

A cirurgia, geralmente, é feita entre os 3 e 6 meses de idade. A data da intervenção cirúrgica varia de acordo com diversos fatores, como grau de obstrução do fluxo de saída ventricular direito, nível de cianose e frequência das crises hipercianóticas. A cirurgia de reparo completo envolve o fechamento do defeito no septo interventricular com retalho, ressecção do músculo hipertrofiado na região subvalvar, valvoplastia pulmonar e, se necessário, aumento do retalho da artéria pulmonar principal.

Entretanto, mesmo o procedimento bem sucedido não resulta em um coração completamente normal. Usualmente, o paciente permanece com certo grau de obstrução do fluxo e a valva pulmonar não funciona perfeitamente. Devido ao reparo cirúrgico, a valva pode não se fechar completamente, levando à regurgitação pulmonar. Com o tempo, essa regurgitação pode gerar complicações. Dessa forma, o paciente deverá ser acompanhado por toda a vida, podendo haver necessidade de procedimentos posteriores.


Vídeos para melhor compreensão da Tetralogia de Fallot:


Indicação de filme: Quase Deuses

O filme conta a história de como foi a primeira cirurgia cardíaca, que surgiu para corrigir a “doença do bebê azul”, ou - como aprendemos - Tetralogia de Fallot.







Referências

  1. FORMAN, Johnna et al. A Review of Tetralogy of Fallot and Postoperative Management. Critical Care Nursing Clinics, v. 31, n. 3, p. 315-328, 2019.

  2. HERAS, Mayra Alexandra Carchi; RODRÍGUEZ, Javier Arturo López. Informe de caso y revisión bibliográfica: Tetralogía de Fallot. Revista de la Facultad de Ciencias Médicas de la Universidad de Cuenca, v. 37, n. 2, p. 59-65, 2019.

  3. MARANGONI, Ana Clara Belônia et al. TETRALOGIA DE FALLOT. Revista Interdisciplinar Pensamento Científico, v. 5, n. 5, 2019.

  4. MOORE, Keith L.. Embriologia Clínica. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

  5. O’BRIEN, Patricia; MARSHALL, Audrey C. Tetralogy of Fallot. Circulation, v. 130, n. 4, p. e26-e29, 2014.

  6. ROSA, Rafael Fabiano M. et al. Síndrome de deleção 22q11. 2 e cardiopatias congênitas. Revista Paulista de Pediatria, v. 29, n. 2, p. 251-260, 2011.

  7. SADLER, Thomas W. Langman embriologia médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2019.

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