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Tumores da hipófise: Vias de acesso e Anatomia da cirurgia

Por Wander Leão Valentim, acadêmico de medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG.


Introdução:


Os tumores da hipófise constituem cerca de 10% dos tumores intracranianos, e são, em sua maioria, adenomas hipofisários - tumores glandulares benignos - , que podem ser funcionais (produtores de hormônios) ou não funcionais. Já os carcinomas de hipófise são raros e geralmente são funcionais (produtores de hormônios), sua diferenciação é muito difícil sob o microscópio e o diagnóstico de carcinoma hipofisários geralmente se da somente após a disseminação para outros órgãos (o que exclui a possibilidade de adenomas, que são tumores benignos e portanto não geram metástase). O quadro clinico é gerado pelo efeito de massa do tumor, comprimindo estruturas adjacentes, e por distúrbios hormonais, seja a presença exacerbada de certos hormônios, no caso dos tumores funcionais, seja pela ausência de certos hormônios devido à destruição da hipófise normal pelo tumor. Dessa forma, alguns dos sintomas possíveis são:

· Diabetes insipido, se houver menor liberação de vasopressina por compressão do hipotálamo.

· Amenorreia e galactorreia em mulheres e disfunção erétil e ginecomastia em homens por produção excessiva de prolactina.

· Gigantismo (figura 1) antes da puberdade ou acromegalia após a puberdade, caso ocorra produção excessiva de GH.

· Síndrome de Cushing caso ocorra produção excessiva de ACTH.

· Cefaleias inexplicáveis e resistentes ao tratamento.

· Distúrbios visuais por compressão quiasma óptico, nervo óptico ou trato óptico.



Figura 1: indivíduo com gigantismo, causado pela excessiva produção de GH antes da puberdade. Disponível em: https://blogdabelinha.blogs.sapo.pt/tag/altura



















Caso clinico:

Paciente do sexo feminino, 46 anos, procurou o serviço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo após diagnóstico prévio de tireotoxicose e indicação de terapêutica ablativa com 131I. Referia perda de peso (6 kg), tremores finos de extremidades, taquicardia e sudorese havia quatro meses. Negava cefaleia, galactorreia, alterações menstruais e distúrbios visuais. Estava em tratamento apenas com propranolol (40 mg 2x/dia). Ao exame físico, ausência de sinais clínicos de tireotoxicose, tireoide discretamente aumentada, indolor e sem nódulos. A avaliação laboratorial revelou concentrações elevadas de T4 livre e de subunidade alfa, TSH no limite superior da normalidade, restante da função hipofisária normal e pesquisa de autoimunidade tireoidiana negativa. A ressonância magnética (RM) de hipófise demonstrou macroadenoma hipofisário. A ultrassonografia (US) da tireoide revelou glândula de volume discretamente aumentado com textura heterogênea. No teste agudo com injeção de octreotida na formulação subcutânea (OCT-sc), 100 µg, houve redução parcial (46%) dos níveis do TSH (4,2mU/mL versus 2,3 mU/mL, basal versus 4h após Oct). Após o diagnóstico, a paciente foi submetida ao tratamento com OCT-sc (100 µg 8/8 horas e, posteriormente, 200 µg 8/8 horas), visando ao controle do hipertireoidismo. Houve redução, mas não normalização dos níveis hormonais. O Oct foi suspenso e introduziu-se o metimazol com normalização, dos níveis de T4 livre e elevação do TSH. A paciente foi submetida à cirurgia transesfenoidal com remoção parcial do tumor e normalização hormonal.

Nesse caso, tratava-se, portanto, de um adenoma hipofisário funcionante, um TSHoma (que produz o hormônio TSH), que, por sua vez, estava gerando um hipertireoidismo, ou seja, um caso de hipertireoidismo secundário, o que ficou claro também pela ausência de autoimunidade tireoidiana, pela tireoide sem nódulos e indolor e pela resposta ao teste agudo com injeção de octreotida, e não de hipertireoidismo primário, como se pensava anteriormente.


Diagnóstico:

Após suspeita clinica por detecção de sintomas que possivelmente podem decorrer de tumores hipofisários, e exclusão de causas mais prováveis, o diagnóstico é feito por exame de Ressonância Magnética. Caso algum sintoma apresentado pelo paciente levante a possibilidade de alteração hormonal específica, pode-se ainda pedir a dosagem de tal hormônio.


Figura 2: Cortes sagital e coronal de um macroadenoma hipofisário na RM. Disponível em: 1. Pak Y, et al. A study on sublabial transsphenoidal treatment of pituitary tumor under microscope with aid of endoscope. Chinese Neurosurgical journal 4, Article number 22 (2018)





Vias de acesso possíveis:

A via de acesso principal para cirurgias de hipófise é a transesfenoidal, ou seja, utilizando-se a passagem através do seio esfenoidal (representado na imagem abaixo, colorido em laranja na parte direita da imagem).



Figura 3: Parede lateral do nariz. Disponível em: NETTER, Frank H.. Atlas de anatomia humana. 7ª ed. RIO DE JANEIRO: Elsevier, 2019








Essa via de acesso é muito indicada pois o osso esfenoide compõem a sela turca, onde se localiza a hipófise, e além disso o osso esfenoide apresenta em seu interior o seio esfenoide, ou seja, um espaço vazio, que possibilita a necessidade de romper menos tecido ósseo para se chegar à hipófise.

Entretanto, em relação à via de acesso ate o osso esfenoide, existem duas possibilidades: a endonasal e a sublabial, sendo a primeira a mais utilizada recentemente devido a um menor tempo de recuperação e menor desconforto nasal, já a segunda é mais utilizada nos casos de tumores muito grandes ou narizes muito pequenos.

Na técnica sublabial, o paciente é colocado em posição supina, já com anestesia geral, enquanto o cirurgião se posiciona do lado direito do paciente, posteriormente a cabeça da mesa de operação é elevada em 15 graus e a face do paciente é virada 30 graus para a esquerda. Prossegue-se então com a esterilização do sulco gengivobucal, do septo e da pele da face ao redor da boca, sendo então administrados lidocaína e adrenalina. É feita então uma incisão horizontal no sulco gengivobucal ate o periósteo da maxila, que foi elevado superiormente à abertura piriforme, à espinha nasal anterior e ao ângulo superior do septo nasal. O contorno anterior do septo nasal cartilaginoso é então incisado e a membrana mucosa é separada dos septos cartilaginosos e ósseos de forma a provocar uma expansão lateral. O septo nasal cartilaginoso é rebatido para a direita a fim de recolocação posterior. Insere-se então o especulo de Hardy e separa-se a mucosa nasal profunda do septo nasal ósseo profundo.

Algumas partes ósseas do septo nasal ósseo são separadas para reparação do chão da sela turca depois do procedimento principal (Figura 4a). A seguir, usando-se o microscópio cirúrgico, acha-se o óstio natural do seio esfenoidal e com uma pressão rápida quebra-se o osso esfenoidal (Figura 4b). É necessário também quebrar quaisquer paredes ósseas internas do seio esfenoidal que possam estar presentes (Figura 4c). Chega-se então na dura-máter (Figura 4d) e, usando uma agulha o teste de punção é feito para avaliar a presença de um cisto ou aneurisma, sendo então posteriormente a dura ressecada (Figura 4e). Posteriormente então, usando-se sucção e curetagem, o tumor é removido (Figura 4f).



Figura 4: Processo de remoção do tumor. a: Inserção do espéculo de hardy no osso esfenóide b: Confirmação óstio do seio esfenoide e remoção do osso esfenoide. c: Confirmação da assoalho selar. d: Remoção do assoalho esfenoidal e exposição da dura-máter selar. e: Abertura da dura-máter selar. f: Imagem após a remoção do tumor. Disponível em: 1. Pak Y, et al. A study on sublabial transsphenoidal treatment of pituitary tumor under microscope with aid of endoscope. Chinese Neurosurgical journal 4, Article number 22 (2018)


Já na técnica endonasal a variação ocorre somente no inicio do procedimento, pois, ao invés de abrir totalmente nariz através da incisão sublabial, o cirurgião insere um endoscópio através da abertura natural de uma das narinas e através dela chega ao osso esfenoide. Dessa forma, a recuperação é mais rápida, mas o espaço para trabalhar é muito menor, dificultando, de certa forma, o procedimento, sobretudo, como dito, nos pacientes com tumores grandes ou narinas pequenas.

Por fim, vale notar que, em ambas as cirurgias, são necessários, geralmente, um neurocirurgião e um otorrinolaringologista, o primeiro tomando conta do acesso, e o segundo da cirurgia principal.



Figura 5: Óstio do seio esfenoidal esquerdo. AC - Arco coanal, S - Septo nasal, CS - Concha superior, OSE - Óstio do seio esfenoidal. Disponível em: Santos R, et al. Acesso endoscópico transnasal aos tumores selares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. vol.73 no.4 São Paulo July/Aug. 2007







Figura 6: Pontos de referência na cavidade nasal. AC - Arco coanal, S - Septo nasal, CI - Concha Inferior. Disponível em: Santos R, et al. Acesso endoscópico transnasal aos tumores selares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. vol.73 no.4 São Paulo July/Aug. 2007







Figura 7: Seio esfenoidal após remoção parcial do septo intersinusal. PE - Plano esfenoidal. NO - Nervo óptico, ACI - Artéria carótida interna, RCO - Recesso carótido-óptioco, ST - Sela túrcica, C - clívus,* - septações incompletas do seio esfenoidal. Disponível em: Santos R, et al. Acesso endoscópico transnasal aos tumores selares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. vol.73 no.4 São Paulo July/Aug. 2007

Figura 8: Diafragma selar invertido no interior da sela, após remoção de macroadenoma. DS - Diafragma selar, ST - Sela túrcica. Disponível em: Santos R, et al. Acesso endoscópico transnasal aos tumores selares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. vol.73 no.4 São Paulo July/Aug. 2007





Pós-operatório e complicações:

A recuperação é consideravelmente rápida, sobretudo nos casos em que se usou o acesso endonasal, sendo geralmente de 48 horas. Entretanto, o paciente rotineiramente fica internado mais tempo, a fim de completar totalmente a avaliação da recuperação da função hormonal da hipófise. Algumas complicações da cirurgião são: fistula liquórica, pneumoencéfalo, ptose palpebral por lesão do terceiro par, hematoma supraselar, secreção inapropriada de ADH, hipotireoidismo secundário, entre outros. Geralmente os pacientes são também acompanhados com RM apos 24 horas, 3 meses, 9 meses e então anualmente.

Muitas vezes pode ocorrer também de o cirurgião não conseguir retirar totalmente o tumor, de forma que segundas abordagens podem ser necessárias.


Referências:

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